“Peço a gentileza de inserir esta foto (1988) da minha mãe, Elza Joana e irmã, Lígia Maria (já falecidas) na luta pela busca do filho e irmão, Joel Vasconcelos Santos, nascido em 09 de agosto de 1948 e desaparecido político em 1971.”
De Altair Vasconcelos para o Vozes do Silêncio.
Portanto, hoje vamos falar de dona Elza, nascida mulher, no dia da mulher, que se tornou mãe, que se tornou mãe de um jovem desaparecido, que se tornou símbolo da luta pela anistia e pela busca incansável dos corpos de tantos filhos e filhas desaparecidos.
Teve seis filhos. Joel era um dos mais velhos. Festeiro como a mãe, ele adorava Uma roda de samba. Muito magro, muito alto, era todo desengonçado, mas não se importava e sempre caía no samba, conta Altair, a penúltima filha. Vascaíno fanático, Joel ia sempre ao Maracanã e levava a pequena Altair nos ombros. Altair lembra também que ele não bebia, não fumava e era louco por bananada. “Tinha sempre uma mariola no bolso”.
O jovem e alegre estudante, de 21 anos, fazia resistência civil à ditadura. Foi preso quando distribuía panfletos e entradas para a peça Rei da Vela e nunca mais voltou ao encontro da sua família.
Costureira de mão cheia, dona Elza era especializada em fazer roupas finas de seda pura, que ela mesma criava. Suas clientes eram mulheres da alta sociedade carioca, mas ela também se vestia do mesmo modo. Estava sempre impecável. E era assim impecável e altiva que ela passou a ir todos os dias na Cinelândia com um cartaz perguntando “onde está meu filho?” Ela escrevia cartas todos os dias às autoridades com a mesma pergunta. Em 1988, como se vê na foto, lá estava ela, com seu modelito moderno, cobrando respostas dos governos democráticos. Respostas que nunca foram dadas. Somente com a Comissão Nacional da Verdade é que veio a confirmação documental da morte de Joel e a notícia de que ele foi enterrado no cemitério de Ricardo Albuquerque, no Rio de Janeiro. Seu corpo continua desaparecido.
oel adorava fazer companhia para dona Elza. Eles teriam frequentado muitas e muitas festas juntos. Neste mês de agosto ele faria 70 anos e certamente comemoraria com muito samba, saboreando satisfeito uma mariola.
Conhece alguma vítima de violência do Estado (morta, desaparecida, presa ilegalmente, torturada) que faz aniversário hoje? A página do evento Ato Vigília pelas Vítimas de Violência do Estado recebe relatos de quem quiser se fazer ouvir. Estas histórias precisam ser contadas, não podem ser silenciadas, e a ajuda de todos fará com que se amplifiquem.
30 de agosto é o dia escolhido pela ONU (Organização das Nações Unidas) para representar as vítimas de desaparecimento forçado, ou seja, aquelas que desapareceram após serem presas ou retidas ilegalmente por forças de segurança.
No Brasil, agosto é também o mês que simboliza a luta pela anistia política. A Lei de Anistia é de 29 de agosto de 1979, vai completar 40 anos. Temos aí 40 anos de luta por uma anistia política dada de maneira restrita, parcial, inconclusa e ainda aplicada às avessas.
O ato será uma grande vigília para lembrar daqueles que foram brutalmente tirados do convívio de suas famílias, por meio de fotos e de suas histórias, e dar voz a quem teve que se manter em silêncio por tantos anos para sobreviver à perda e à injustiça.
Vá ao Ato! Conte essas histórias! E leve flores. Carregue-as como símbolo de uma cultura de amor e de muitas lutas memoráveis pela democracia.