Como membro da Coalizão Memória, o Núcleo de Preservação da Memória Política endossa a seguinte nota:
A Coalizão Memória saúda a decisão da Justiça Federal de Campos dos Goytacazes (RJ) de condenar o ex-delegado do DOPS do Espírito Santo, Cláudio Guerra. Inédita, a decisão representa a primeira condenação criminal de um agente da ditadura por crimes cometidos no período.
Réu confesso, Guerra participou da estrutura repressiva do regime autoritário desaparecendo com cadáveres de militantes assassinados sob tortura na Casa da Morte, os quais eram transportados pelo delegado até uma usina de cana de açúcar localizada no município de Campos, onde o agente os incinerava.
Vale ressaltar, ainda, que os depoimentos públicos de Cláudio Guerra não se limitaram a explicitar a dinâmica de desaparecimentos de corpos na Usina de Cambahyba. Elementos como o financiamento empresarial da estrutura repressiva, a atuação de grupos de extermínio e a ação de grupos terroristas militares de extrema-direita na abertura política também foram revelados pelo delegado. Ainda que estes não sejam o objeto da sentença, entendemos que a condenação é emblemática pelo papel que Guerra historicamente cumpriu no interior da estrutura repressiva, articulando todas essas dimensões.
A Justiça Federal acatou os dois argumentos apresentados pelo Ministério Público Federal para afastar os efeitos da Lei de Anistia de 1979. Reafirmou, assim, que crimes de lesa-humanidade são imprescritíveis e não passíveis de anistia, e que o desaparecimento é um crime continuado, cujos efeitos se estendem até o presente, e que portanto o diploma legal imposto pela ditadura em 1979 não pode se aplicar a eles.
Esperamos que a decisão seja um ponto de inflexão para o poder judiciário brasileiro. Que finalmente caia o véu da impunidade representado pela Lei de Anistia, que até hoje representou um óbice para a concretização do direito à justiça. Caso haja recurso, esperamos que as instâncias superiores reafirmem a decisão da Justiça Federal de Campos dos Goytacazes e mantenham a condenação de Cláudio Guerra.